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A maioria das pessoas já sentiu a sensação nervosa de “frio na barriga” ou náusea diante de más notícias. Essas experiências demonstram a profunda conexão entre o cérebro e o intestino, mostrando que existe uma influencia entre um e outro.

Uma das condição mais comuns na prática clínica em gastroenterologia, determinada justamente por um problema na relação cérebro-intestino é a Síndrome do Intestino Irritável (SII).

O que é a Sindrome do Intestino Irritável?

A Síndrome do Intestino Irritável é um termo aplicado a uma associação de sintomas que consistem mais frequentemente de dor e distensão abdominal, constipação e diarreia. Muitos pacientes com SII alternam períodos de diarreia com constipação.

Caracteriza-se por uma doença funcional, já que possui ausência de anormalidades estruturais e bioquímicas em todos os exames complementares, laboratoriais e de imagem.

Ao longo das últimas décadas temos procurado por melhores maneiras de tratar estes pacientes pois até metade das pessoas que sofrem de SII estão insatisfeitas com os resultados do tratamento médico padrão e continuam a ter sintomas frequentes como diarreia, constipação, inchaço abdominal e dores.

Recentemente, centros médicos dos EUA começaram a mostrar seus resultados como o uso da “hipnoterapia direcionada ao intestino”, em especial como uma forma para tratar a síndrome do intestino irritável.

Instituições médicas de renome mundial como o Mount Sinai em Nova York, a Universidade de Michigan, o Beth Israel Deaconess Medical Center em Boston, a University of Washington em Seattle, o Baylor College of Medicine em Houston e o Loyola University Medical Center e o Northwestern Memorial Hospital na área de Chicago agora oferecem ou sugerem hipnoterapia para pacientes com SII.

Hipnoterapia como tratamento para a SII

Na hipnoterapia direcionada ao intestino são trabalhadas técnicas hipnóticas através de sessões presenciais com um terapeuta, e também com o uso de gravações para treinamento do paciente em seu próprio domicilio. Assim que os pacientes entram no estado hipnótico, eles são levados a exercícios de visualização e ouvem sugestões destinadas a acalmar o trato digestivo e evitá-los de se concentrar nas sensações intestinais.

Muito além de uma “meditação guiada”, essa terapia foi padronizada e testada – esta é uma das principais razões para ter sido aceita por gastroenterologistas em grandes hospitais. Há mais de 20 anos atrás, o psicólogo clínico Olafur Palsson, PsyD, da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, começou a usar um conjunto específico de scripts em um protocolo que agora foi amplamente estudado. De 53 a 94 por cento dos pacientes com SII responderam ao tratamento, dependendo do ensaio, com benefícios que duraram até um ano.

A terapia aborda um problema que parece acompanhar várias doenças gastrointestinais: falha de comunicação entre o intestino e o cérebro. Os músculos lisos da parede intestinal podem ser hiper-reativos, alterando os padrões normais de contração muscular. Além disso, o cérebro também pode interpretar mal os sinais normais do intestino.

Essa desconexão entre o intestino e o cérebro pode desencadear muitos sintomas possíveis da SII – e desempenhar um papel em outros problemas.

Pesquisas recentes recentes sugerem, por exemplo, que a hipnoterapia pode prolongar a remissão em pacientes com colite, dispepsias funcionais e dores epigástricas (pirose ou queimação) crônica sem causa orgânica determinada. A hipnoterapia tem se mostrado mais eficaz no tratamento da dor abdominal, reduzindo-a pela metade ou mais em muitos estudos.

Quando procurar tratamento para a Síndrome do Intestino Irritável?

Muitas pessoas lutam com os sintomas digestivos, mas nunca os mencionam a um médico. É comum tentar muitos remédios por conta própria, evitar alimentos picantes ou ficar sem glúten ou lactose.

Obter um diagnóstico é o primeiro passo para um tratamento eficaz. Para diagnosticar SII – que estima-se que afete até 15 por cento dos adultos americanos – procuramos por: pelo menos três meses com dor abdominal frequente que é aliviada depois de defecar e que originalmente começou com uma mudança na frequência ou qualidade de suas evacuações.

A SII também tende a ocorrer após uma gastroenterocolite aguda ou mesmo após a realização de tratamentos com antibióticos, isso tem a ver com a DISBIOSE intestinal, o que falaremos em outro post.

Sangue nas fezes, perda de peso, febre ou anemia sugerem outros diagnósticos possíveis. Como por exemplo, devemos estar atentos a problemas autoimunes, como doença de Crohn, colite ulcerativa ou doença celíaca, em clientes apresentando esses sintomas. Nunca é demais também dizer que devemos estar atentos com a presença de tumores, onde sintomas como os citados podem estar presentes.

Por definição, a SII não tem uma causa clara. Os últimos avanços científicos tem sugerido possíveis fatores como variações genéticas e microbiomas intestinais alterados para subgrupos de pacientes. Por isso, um tratamento que tem sido muito empregado é a dieta com baixo teor de FODMAPs, que exclui muitos vegetais e frutas, bem como o glúten. FODMAPS significa oligossacarídeos fermentáveis, dissacarídeos, monossacarídeos e polióis, moléculas presentes nos alimentos citados.

Em um estudo de 2016, a hipnoterapia direcionada ao intestino correspondeu aos mesmos resultados alcançados com a dieta com baixo teor de FODMAPS. Esta é uma boa notícia para os pacientes com SII, uma vez que abre um caminho potencialmente mais fácil para, eventualmente, desfrutar de uma dieta mais ampla e saudável.

Como isso funciona?

O protocolo leva em torno de três meses para ser concluído e requer treinamento diário. Os pacientes recebem após uma determinada fase do tratamento, uma gravação em áudio para ouvir todos os dias, ou pelo menos cinco vezes por semana.

Eles também têm em torno de 5 sessões presenciais, com duração variável de 1:30h a 3h, em intervalos médios de duas semanas.

Durante as sessões, várias técnicas serão usadas, seguindo uma linha base, mas também customizadas de acordo com as necessidade de cada indivíduo. Sempre é importante lembrar que no estado de hipnose as pessoas ficam totalmente alertas, não existe perda de consciência, muito pelo contrário, são sessões onde há muita participação e interação entre terapeuta e cliente. Assim, você pode praticar a auto hipnose através dos áudios a qualquer hora do dia e, após uma sessão, vai estar perfeitamente em condições de fazer toda e qualquer atividade.

A hipnose na SII pode ser usada para crianças?

A brincadeira imaginária conduzida no cenário da hipnose, faz com que o programa pareça ideal para crianças com problemas digestivos, geralmente dores abdominais inexplicáveis.

Trabalhando com Palsson, sua colega Miranda van Tilburg, PhD, desenvolveu um protocolo mais curto projetado para uso doméstico por crianças de 6 a 12 anos.

Essas sessões convidam as crianças a flutuar em uma nuvem, navegar no oceano em um barco que balança suavemente ou voar em um tapete mágico controlado por sua mente. Em sessões mais curtas, eles descem um escorregador, balançam em um balanço, andam de trenó em uma montanha de neve ou saltam na lua. Não há limites para a imaginação (sobretudo a infantil).

Seis meses após a conclusão, mais de 60 por cento das crianças que passaram por este programa mantiveram seu progresso, reduzindo os sintomas em pelo menos metade, relata a equipe de pesquisadores, acrescentando que a maioria das crianças com dor abdominal e dor de cabeça relatou melhora em ambos. Além disso, muitos pais relataram melhorias no sono e no foco na escola.

Separadamente, uma equipe holandesa concluiu que, após a hipnoterapia direcionada ao intestino, dois terços de um pequeno grupo de crianças com SII crônica ou dor de estômago estavam pelo menos 80% melhores quase cinco anos depois.

A Hipnoterapia é o tratamento certo pra mim?

Parte do grande atrativo deste protocolo de tratamento é que ele foi projetado para funcionar com uma ampla variedade de pacientes, sejam eles portadores de diarreia, constipação ou dor.

Os pacientes não precisam ser especialmente receptivos à sugestão para que a hipnoterapia seja bem-sucedida. Não se trata de ser hipnotizável ou não. Este é um conceito que há muito tempo já caiu em desuso. Todos nós podemos usufluir dos seus benefícios, basta querer.

No entanto, o medo é uma desvantagem. A hipnoterapia funciona melhor com pessoas que demonstram estar mais a vontade com a técnica. A participação do terapeuta será importante no sentido de trazer esta segurança ao cliente, sanando todas suas dúvidas.

Ainda segundo Laurie Keefer, PhD, Diretora de Pesquisa Psicocomportamental da Divisão de Gastroenterologia do Hospital Monte Sinai em Nova York, “esta técnica terá melhor efeito em pessoas que realmente sentem fisicamente os sintomas, em vez de pessoas que passam muito mais tempo evitando situações ou se preocupando em como se curar”.

Para esta ultima, está muito bem indicada a associação da hipnoterapia com a terapia cognitivo-comportamental (TCC), que trabalha no sentido de mudar hábitos mentais.

As pessoas também podem ter mais problemas com a hipnoterapia se forem céticas ou estarem num estado depressivo muito severo. Você tem que estar aberto e disposto a isso.

Por fim, o programa de três meses requer paciência e dedicação. Costumo dizer que padrões e problemas que se consolidaram por décadas não irão desaparecer em algumas semanas.

A maioria dos pacientes começa a experimentar o progresso após a terceira ou quarta sessão, e às vezes até depois disso. Considero isso um resultado rápido, uma vez que muitos estão nesta busca há anos, mas não se trata de uma solução mágica.

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Por Dr. Alberto Bicudo Salomão.

Médico – Cirurgião Gastroenterologista.

CRM 3841 RQE 1356

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