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Os avanços na compreensão da fisiologia e anatomia funcional do cérebro, tem nos feito compreender cada vez mais às várias relações existentes entre ele e as diversas outras estruturas do nosso organismo.

Quanto mais se estuda, mais chegamos à conclusão que não somos seres que funcionam de uma maneira fragmentada: o ser humano é o resultado da evolução de um organismo vivo onde todo o seu funcionamento se conecta – o que ocorre em qualquer parte do corpo tem reflexo direito ou indireto sobre o todo.

Sistema nervoso, endócrino, cardio-respiratório, digestivo, excretor, músculo-esquelético e imunológico funcionam de maneira uníssona. O objetivo deste funcionamento é a adaptação ao meio e manutenção da sobrevivência.

Esta adaptação, que ocorre a todo instante em nosso corpo, busca garantir um estado de relativo equilíbrio interno, necessário para que nossas funções metabólicas ocorram dentro de uma certa normalidade – a este estado chamamos homeostase.

Sistema imunológico

De uma maneira objetiva, podemos dizer que o sistema imunológico é aquele responsável por garantir uma frente de defesa contra todo elementos biológico considerado estranhos ao nosso organismo. Como exemplo destes elementos temos:

  • Micro-organismos (comumente chamados germes, como bactérias, vírus e fungos)
  • Parasitas (como vermes)
  • Células cancerígenas
  • Órgãos e tecidos transplantados

Assim, para defender o nosso corpo contra esses invasores, o sistema imunológico deve ter a capacidade de distinguir entre o que pertence ao organismo (o próprio corpo). e o que não pertence (não próprio do corpo ou estranho).

É importante lembrarmos aqui que, se o sistema imunológico tiver uma disfunção e confundir o próprio corpo com algo estranho, ele pode atacar os tecidos do próprio organismo, causando uma doença autoimune, como artrite reumatoide, tireoidite de Hashimoto ou lúpus eritematoso sistêmico (lúpus), entre outras.

Uma imensa gama de estudos científicos recentes têm demonstrado que o estresse é capaz de influenciar o sistema imunológico e, inversamente, que esse sistema pode alterar o comportamento e as emoções e, até mesmo, deflagrar transtornos físicos e psiquiátricos.

As alterações de saúde induzidas pelo estresse são o resultado de uma rede complexa de interações entre muitos sistemas do corpo, nos quais o sistema imunológico desempenha papel essencial.

Os diferentes tipos de estresse (físico, psicogênico ou inflamatório), a sua duração (agudo ou crônico), a intensidade e o momento de ocorrência (infância, vida adulta, senilidade…), o estado nutricional do indivíduo e a predisposição genética são os grandes determinantes do resultado do enfeito deste todo na função imune.

Vamos falar neste post sobre tudo isso. Se você o ler até o final, certamente aumentará a compreensão sobre o assunto.

Estresse

Primeiro quero que vocês entendam que o estresse é uma resposta adaptativa, responsável por nossa sobrevivência e perpetuação da nossa espécie no planeta.

Pense em nossos ancestrais primitivos. O que seria de nós se a natureza não tivesse nos providos de mecanismos extremamente eficazes para lidar com os vários desafios impostos ao longo de nossa evolução?

A capacidade de prever o perigo reagindo antecipadamente a ele pode ter sido determinante para a nossa sobrevivência. Todavia, em tempos modernos, essa herança biológica é fonte de muitos dos nossos problemas, em especial se não a entendermos e sabermos lidar com ela.

O principal papel biológico desempenhado pela resposta ao estresse é o de garantir a sobrevivência, ativando a reação de luta ou fuga e preparando o sistema imunológico para desafios potenciais.

O desequilíbrio desta função inata tem importante papel causal em diversas doenças psiquiátricas e físicas sejam elas cardiovasculares, gastroenterológicas, autoimunes, pulmonares e cânceres.

CONCEITO DE ESTRESSE E O PAPEL DA CARGA ALOSTÁTICA

Firdaus Dhabhar e Bruce McEwen descreveram o “estresse” como uma série de eventos constituídos por algum estímulo (estressor físico ou psicológico) que deflagra uma reação no cérebro (percepção do estresse), levando à ativação dos sistemas de luta ou fuga (resposta fisiológica do estresse).

Imagine que existem duas linhas de transmissão através das quais o estresse é retransmitido do cérebro para o corpo. A primeira vamos chamar de HPA (eixo hipotálamo-hipófise-adrenal) – as informações que seguem essa linha de transmissão irão levar a liberação do hormônio mais importantes relacionado a resposta ao estresse, os glicocorticóides, onde destacamos o cortisol.

A segunda linha de transmissão vamos chamar SNS (sistema nervoso simpático), com a consequente liberação de outro tipo de hormônio, as catecolaminas (noradrenalina/adrenalina).

Esses dois sistemas são ativados conjuntamente e coordenam a resposta de muitos outros sistemas fisiológicos que reagirão em resposta a agente estressor, incluindo os sistemas imunológico e cardiovascular, bem como a produção/utilização de energia (orçamento corporal – sugiro ler o meu post “Seu cérebro é uma máquina de gerenciamento de energia: entenda seu orçamento corporal”) e o comportamento, permitindo que o indivíduo atenda com êxito às demandas do desafio e depois conduza o corpo de volta à homeostase.

A resposta de “luta ou fuga” consiste na rápida mobilização de energia dos locais de armazenamento para músculos críticos e o cérebro, de maneira concomitante com o aumento da frequência cardíaca, pressão arterial e frequência respiratória para facilitar o rápido transporte de nutrientes e oxigênio aos tecidos relevantes.

Durante essas situações de emergência, a ativação do eixo HPA desviará recursos metabólicos dos processos de crescimento, digestão e reprodução para o desafio mais imediato em questão.

Carga alostática

Para McEwen e Dhabhar, a resposta ao estresse deve ser analisada em relação ao estresse agudo (curta duração, minutos a horas) até o estresse crônico (estresse repetido ou prolongado por dias ou anos).

Eles denominaram de “carga alostática” a depreciação ou desgaste do corpo que ocorrem quando diferentes sistemas biológicos são ativados para manter um estado de equilíbrio em resposta às demandas impostas por indutores internos ou externos de estresse crônico. Eles ainda sugeriram que uma situação de alta carga alostática resultaria em desregulação do corpo, com supressão da função imune.

A volta ao equilíbrio corporal depende de uma série de aspectos psicológicos (como mecanismos de enfrentamento, otimismo, apoio social, experiências precoces de vida, aprendizado) e fisiológicos (reatividade neuroendócrina, genética, ambiente, nutrição e sono).

Assim, é importante enfatizar que a resposta ao estresse é um mecanismo relevante que nos permite responder imediatamente a estímulos externos e internos. Isso é essencial para a sobrevida e benéfico a curto prazo (estresse agudo e estresse positivo).

Contudo, essa resposta pode se tornar nociva quando prolongada (estresse crônico ou estresse negativo). Portanto, estudos na área de estresse devem levar em consideração não somente as características do estresse (duração e intensidade), mas também os aspectos psicológicos e fisiológicos do indivíduo que serão importantes para determinar a recuperação ou a suscetibilidade ao desenvolvimento de doenças.

EFEITOS DO ESTRESSE AGUDO VERSUS CRÔNICO SOBRE O SISTEMA IMUNOLÓGICO

O resultados dos estudos recentes tem nos mostrado que o estresse, ou de modo mais específico, seu principal hormônio, os glicocorticoides (cortisol), exercem efeitos estimulantes ou supressores sobre o sistema imunológico.

Esta estimulação ou supressão vai depender de uma série de fatores. Entre eles estão a duração do estresse (agudo versus crônico), intensidade do estresse/concentração dos hormônios do estresse, sincronização do estresse em relação à resposta imune, tipo de reposta imune e qual compartimento imune está sendo afetado.

Da mesma forma que a resposta ao estresse agudo prepara os sistemas cardiovascular, musculoesquelético e neuroendócrino para luta ou fuga, seria adaptativo preparar o sistema imunológico para desafios, como ferimentos e infecções provavelmente atribuídas às ações do estressor.

Contudo, também é crucial deter a resposta inflamatória inicial a tempo para evitar quaisquer consequências nocivas de alguma resposta imune hiperativa.

Para facilitar vamos buscar entender todo este processo de uma maneira metafórica.

Imagine que com centro de nosso cérebro temos uma estação de radio-transmissão – esta estação se chama tálamo.

O tálamo está todo o tempo recebendo e retransmitindo as informações que chegam até ele de todas as partes do corpo (estímulos interoceptivos) e também aquelas que vem do ambiente externo, captados por nossos cinco sentidos (estímulos exteroceptivos). Além disso, uma outra zona importante que leva e recebe informações do tálamo é o córtex pré-frontal, área de onde vêm nossos pensamentos.

Imagine que em um determinado momento chega ao tálamo uma informação interpretada como algo potencialmente perigoso. Esta informação pode ser advinda de perigo real ou criado a partir do funcionamento cognitivo de cada indivíduo (um pensamento catastrófico ou fóbico por exemplo). Independente disso, o tálamo retransmitira a informação, direcionando para os setores que buscam garantir a nossa proteção contra a eminente ameaça.

Em outras palavras, o “alarme” soou. O tálamo sinaliza esse sinal de alerta para a amígdala cerebral e para o hipotálamo, que ativa a glândula pituitária (hipófise). Todas essas são áreas anatômicas cerebrais muito próximas. Mas o passo seguinte envolverá uma mensagem que em milésimos de segundo chegará a outro extremo do corpo: a glândula supra renal (adrenal). Ali será liberado o cortisol.

Paralelamente, o Sistema Nervoso Simpático leva a liberação de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina), os sinais da ativação desta via talvez serão os mais evidentes para você:

• Coração acelerado

• Pupilas dilatada

• Respiração rápida

• Extremidades frias

• Pelos eriçados

• Desconforto na barriga, etc.

Um outro processo talvez passará alheio a sua observação mas estará também ocorrendo: a ativação imunológica. Aqui entra mais um personagem, as nossas células de defesa: os leucócitos. Imagine-os como sendo soldados que normalmente estão ocupando seus quartéis (locais de armazenamento, como o baço). Ao soar o chamado da ativação neuro-hormonal (cortisol e catecolaminas), em minutos eles partem para a circulação rumo ao combate.

Conforme o estresse continua (agudo/horas) e os níveis de cortisol sobem e estes soldados são mobilizados da circulação para os “campos de batalha” ou primeira linha de defesa, como pele, pulmões, tratos gastrointestinal e urogenital, superfícies de mucosas e linfonodos. Imagine como soldados ocupando pontos chaves do organismo, que precisam ser prontamente defendidos por serem portas de entrada para agressores.

Nossos soldados começam então a disparar sinais de sua localização. Esses sinais são o que chamamos de INFLAMAÇÃO. A presença da inflamação significa que seus soldados estão ali. E ali ficarão até a resolução do desafio (ou seja, desaparecimento do agressor).

O local da inflamação é um cenário de guerra. E numa guerra inocentes (no caso células sadias) também acabam morrendo. É preciso então que a intensidade desta inflamação seja modulada ou tudo acabará sendo destruído. Quem faz este trabalho também são os glicocorticóides.

Por esse motivo, na atualidade entendemos os glicocorticóides como hormônios imunomoduladores capazes de estimular e suprimir a função imune, dependendo da intensidade, tipo e local da agressão.

A ativação ou a inibição do sistema imunológico também pode depender da duração do estresse (agudo versus crônico). Falamos até aqui do estresse agudo. Mas imagine agora que você é o funcionário do Tálamo responsável por disparar o sinal de perigo para ativação da resposta ao estresse.

E você começa a ser estimulado e a fazer isso tantas vezes que em certo momento essa tarefa virou algo habitual (normal). Em outras palavras, o estresse ficou crônico. Neste momento, os níveis mais elevados de cortisol, aos invés de ativar começam a inibir a ação das nossas células de defesa. Uma inibição que chega a deixar a atividade delas abaixo do nível basal (normal ou “saudável”).

É como se o alarme tocasse e os soldados não dessem mais importância dado a tantas vezes que ele já tocou. Por meio desse processo, esses efeitos deixam de ser adaptativos, tornando o sistema imunológico ineficaz no combate a infecções e cânceres.

Agora que sabemos de tudo isso, voltemos a definição inicial de estresse. Eventos constituídos por algum estímulo estressor físico ou psicológico não é mesmo? Este último merece destaque pois seja físico ou psicológico a resposta será a mesma. Então, o que esperar do indivíduo que está cronicamente exposto ao estresse psicológico. Acho que você já pode inferir a resposta.

O estresse psicogênico comprovadamente aumenta a atividade inflamatória em nosso corpo ao passo que sua imunidade celular está reduzida. Estudos recentes também demonstraram que esse tipo de estresse é capaz de afetar as células de defesa (soldados) que existem no cérebro (ali chamados de células da glia) – o cérebro se torna cronicamente inflamado.

De fato, esse pode ser um dos mecanismos pelo qual o estresse psicogênico precoce (eventos no início da vida) exerce impacto sobre a reação de estresse ao longo da vida do indivíduo.

ALTERNATIVAS CONTRA O ESTRESSE E A FAVOR DA SUA SAÚDE IMUNOLÓGICA

Os estudos atuais têm enfatizado a importância de intervenções no comportamento, como música, ioga, meditação (mindfulness), tai chi chuan e psicoterapia com ou sem o uso da hipnose, além das mudanças no estilo de vida, como exercícios físicos, dieta adequada e cessação do tabagismo, e alterações no local do trabalho e no espaço físico para reduzir o impacto do estresse e as doenças relacionadas ao estresse. Lembrem-se ainda da importância do sono.

O sono é infinitamente mais complexo, profundamente mais interessante e assustadoramente mais relevante para a nossa saúde do que imaginamos (leia o post “Porque dormimos? A ciência do sono por Matthew Walker‘ aqui no blog HipnoGastro).

Interações sociais positivas, toque físico e trocas afetivas carinhosas ativam a produção de ocitocina. Esse hormônio pode ter efeitos antiestresse e aumentar a resiliência aos quadros dolorosos. Interações sociais positivas determinam níveis diminuídos de citosinas anti-inflamatórias e levam a menor reatividade ao estresse. Pense a este respeito e busque corrigir os pontos em sua vida que precisam de ajuste.

Se achar que não é capaz, procure ajuda. Nós médicos estamos aqui para lhe ajudar.

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